Sunday, May 31, 2009

O MENINO E A GUERRA







Na década de quarenta, em tempos de guerra, um menino pobre do estado do Rio Grande do Sul desenvolveu o que pode ser considerado o primeiro porco verde do Brasil.
Os reflexos da guerra obrigaram-no a ser um pesquisador, que por muitos técnicos foi chamado de chato em “pesquisas empíricas”.
Este menino, nascido em Cinqüentenário (RS), município de Santa Rosa (RS), aos 02 anos de idade perdeu o pai em surto de Tifo.
Uma vez por semana, lia a sua mãe os horrores da guerra no único veículo de comunicação da região, o jornal semanal, Correio Rio-grandense.
O FRANGO VERDE
Com quatro anos de idade, foi crismado, quando comeu e sentiu o sabor da primeira bolacha. Na mesma época, chegou a ficar um ano sem comer pão e sal.
Sustentava a família uma pequena horta cultivada pela sua mãe no quintal de casa.
Aos sete anos, começou a freqüentar uma pequena escola do interior. Muitas vezes com os pés descalços, pisando em neve e espinhos, caminhou para a sala de aula. Suas roupas eram coloridas não pela estampa do tecido e sim pela quantidade de remendos que tinham.
Tantas dificuldades fizeram o menino pobre do interior a tomar uma decisão, procurar aprender de tudo para sair daquela situação em que se encontrava e preparar-se para enfrentar a difícil vida que se eternizava.
Aos oito anos de idade fez a sua primeira experiência. Ao ver dezenas de galinhas no quintal, com seus pintainhos, decidiu fechá-los para forçar as galinhas a botar ovos.
Naquela época, não havia rações balanceadas e nem medicamentos para tratar os pintos presos nas gaiolas. Álido tratava-os com milho triturado no pilão. Foi péssimo o resultado, mas o menino pesquisador não desanimou, passou a fornecer aos pintos, junto com o milho, couve e alfafa picadas. Sem perceber, conseguira produzir o frango verde.
Por muitos anos, Álido Brun criou galinhas de postura com 50% de ração e muita verdura, leucena e almeirão, com sucesso.
O PRIMEIRO PORCO VERDE
Aos dez anos pediu para a sua mãe dez mil reis para comprar uma leitoa. A mãe atendeu o menino, mas avisou: “ tivemos muita seca e temos pouco milho”. Preocupado em manter o estoque de milho para as demais criações do pequeno sítio, passou a alimentar a leitoa somente com verdura e água. Álido Brun entusiasmou-se quando recebeu da experiente camponesa, sua mãe, o elogio pelo belo animal que havia conseguido apenas com tratos verdes.
Com dezesseis anos, adolescente muito curioso, leu em uma revista da época, que um norte-americano havia tratado oito leitões apenas com alfafa e água. Aos oito meses pesavam 105 Kg. Levado pelo instinto, Álido repetiu a experiência lida na revista. Fechou oito leitões, ainda com a porca mãe e passou a alimentá-los com alfafa, rama de mandioca e água. Aos oito meses conseguiu 106 Kg por animal, em média.
Nos frangos, que continuava a tratar com verde, a diferença do sabor foi rapidamente sentida pela família, mas no porco, talvez pela raça criada, não se sentiu muita diferença.
A UVA NO CENTRO-OESTE
Passaram-se os anos e o menino curioso rendeu-se à invasão da soja no país e passou a cultivá-la. Foi assentado em programa de reforma agrária no município de São Gabriel do Oeste (MS) onde viveu enorme dificuldade ao tentar a sobrevivência com a soja.
Em Chapadão do Sul, foi novamente assentado e lembrou das dificuldades que passara quando criança. Voltou a dedicar-se novamente aos seus sonhos de menino e à teimosia das suas pesquisas.
Ainda em São Gabriel do Oeste, manteve a tradição dos sulistas, entre elas, possuir uma parreira de uvas no quintal.
Em Chapadão do Sul, plantou como de costume a sua parreira, mas observou que o clima do cerrado não era adequado para a cultura. Inconformado passou a investigar. Se o solo do cerrado pode ser corrigido, fertilizado e consegue-se água, porque não produz a uva?
Em pouco tempo, a persistência do pequeno produtor começa a dar resultados o que chamou a atenção dos produtores e da imprensa. Álido introduz com sucesso a uva no cerrado brasileiro.
Transformou-se em consultor no assunto. Foi o responsável pela introdução da uva em vários municípios do estado de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, consolidando a cultura e dando oportunidade de renda a muitos produtores rurais.
O SONHO RETOMADO
O porco verde, entretanto, não saía da cabeça do persistente e sonhador agricultor. Há dois anos, Álido voltou a investir no porco verde. Aproveitou as suas experiências de menino e as juntou aos conhecimentos adquiridos ao longo da sua vida. Com o cruzamento de novas raças de suínos conseguiu melhorar o porco verde que criou quando criança.
Hoje cria o porco verde basicamente com capim, cana, leucena, mandioca e soro de queijo. Na alimentação entram também as folhas e tronco de bananeira, que segundo Brun, têm excelente teor nutritivo e funcionam como vermífugo.
Está pronto para o abate em 8 a 9 meses, com 100 Kg de peso. Tem no máximo 5 Kg de gordura.
O suíno de granja chega ao abate com metade desse tempo, em 130 dias, mas custa, aos 100 Kg, cerca de R$170,00, enquanto o porco verde alcança no máximo o custo de R$50,00.
O porco verde, como o chama, sem preconceito, tem um sabor muito especial. Dizem os entendidos que a carne nada perde para a paca, uma das caças mais saborosas do Brasil Central.
PRODUTOS ARTESANAIS E ECOLÓGICOS
As experiências de Brun não param por aí. Atualmente fabrica o “Queijo Brun”, tipo de queijo artesanal e ecológico, já conhecido e saboreado até no exterior.
Esse queijo receberá em breve um registro especial com o seu nome.
Brun confessa que demorou quatro anos de muita pesquisa e experimentação para chegar ao seu queijo especial. Recebem, as suas vacas, alimentação natural à base de vegetais e homeopatia que dão o sabor diferenciado ao produto.
Há dois anos decidiu voltar à suinocultura dos tempos de criança. Agora o alimento é homeopático e vegetal. Nada de produtos químicos ou medicamentos. Vivem os animais em piquetes automaticamente limpos. A alimentação saudável e natural diminui a incidência de doenças e pragas.
Quando ocorre algum problema entra em cena a homeopatia, com uso de produtos sempre naturais.
SOLUÇÃO PARA O PEQUENO PRODUTOR
O sonho de Brun vai além do sabor e do custo baixo do porco verde e da excelente qualidade do seu queijo, presuntos e compotas que produz artesanalmente. Confessa, com convicção, que encontrou a solução para a sobrevivência do pequeno produtor, como ele assentado do INCRA. É ainda a oportunidade de se produzir alimentos mais saudáveis e saborosos.
O trabalho de Brun chama atenção das autoridades que buscam meios para resolver o problema de legalização para o comércio da produção artesanal na zona rural.
Para avaliar a sua descoberta, haverá no próximo mês de julho, em Campo Grande, uma noite de degustação do porco verde. Será a sua carne comparada ao chamado porco caipira, caseiro e ao suíno de granja.
Estarão presentes técnicos no assunto, professores de universidades, autoridades e produtores interessados em conhecer as descobertas de Brun.
Para ele, o pequeno produtor pode ter uma vida boa e ser bem remunerado como o habitante da cidade. Precisa ser orientado a produzir produtos diferenciados e saudáveis.
Em época de modismos no mundo moderno e na busca de produtos adequados à saúde do ser humano, Álido Brun, o menino pobre que somente fez o curso primário no Rio Grande do Sul, hoje assentado do INCRA, pode estar carregado de razão.


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